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Certamente
foi a Anestesiologia uma das especialidades médicas que mais rapidamente evoluiu nestes
últimos anos, fato esse confirmado pelo seu elevado estágio técnico-científico e pelos
seus resultados tão espetaculares. Para continuar assim. vão ser necessários cuidados
permanentes na sua consolidação e retomadas de rumo e vigilância permanente sempre que
se fizer exigidos. Antes, não é segredo, constituía apenas uma atividade acessória e auxiliar da
cirurgia - uma "terra sem dono", por onde transitava todo mundo: o colega recém-chegado, o estudante de férias ou os serventes dos hospitais. Hoje, a coisa não é mais assim. A Anestesiologia assumiu um lugar mais
destacado, uma autonomia indiscutível e uma atividade cuja prática é tão imprescindível e irrecusável que, muitos dos atos médicos agora praticados, não
seriam realizados sem o seu inestimável concurso. A moderna concepção que se tem da
Anestesiologia exige, portanto, uma soma muito ampla e diversificada de conhecimentos e a
correta aplicação de uma sofisticada tecnologia de monitoração no controle dos
sistemas vitais e dos próprios equipamentos. Desse modo, todos os dias, hospitais e serviços especializados, vão se cercando
cada vez mais de recursos em instrumentais de monitorização e de profissionais altamente
qualificados, como forma organizada e eficiente de vencer a morbi-mortalidade. Daí porque
atualmente passou-se a exigir muito dos médicos especializados, entre eles os
anestesiologistas, chegando-se ao exagero de não mais se aceitar um mau resultado, face a
precisão que se espera de suas técnicas tão refinadas e a eficiência de fármacos tão
potentes. Sob outro prisma, passou-se então a entender que a opção por determinado tipo
de anestesia não significa apenas um procedimento mecânico ou a decisão preferencial do
anestesista, mas uma questão eminentemente clínica, cuja avaliação se dê caso a caso
e sempre em favor do paciente. Para tanto, leva-se em conta seu estado físico e mental,
seu diagnóstico, suas condições fisiológicas, as influências farmacológicas e o tipo
de operação que é quer realizar. Em suma: a indicação de uma anestesia é antes de
tudo uma decisão clínica. 2. A questão de fundo: Anestesiologia:
Obrigação de meios ou de resultado? Muitos admitem que o contrato de assistência médica é uma locação de
serviços. Outros, que a forma correta é considerá-lo um contrato sui generis, em
virtude da especificidade e da delicadeza mais singular entre o profissional e o seu
paciente como ensina Alves Dias (in Da Responsabilidade Civil, 6ª edição, vol. 1
e 2, Rio: Forense, 1979). Dentro do conteúdo das obrigações positivas, onde se exige do devedor um
comportamento ativo de dar ou de fazer alguma coisa, são reconhecidas duas modalidades de
obrigações: a de meios e a de resultado. Na primeira, existe o compromisso da utilização de todos os recursos
disponíveis para se ter um resultado, sem, no entanto, a obrigação de alcançar esse
êxito tão legítimo. Busca-se, é claro, um resultado, mas em não se cumprindo - e
inexistindo a culpa do devedor, não há o que cobrar. Na obrigação de resultado a prestação do serviço tem um fim definido. Se
não houver o resultado esperado, há inadimplência e o devedor assume o ônus por não
satisfazer a obrigação que prometeu. Assim entendendo, existe na responsabilidade contratual civil do médico uma
obrigação de meios ou de diligências, onde o próprio empenho do profissional é o
objeto do contrato, sem compromisso de resultado. Cabe-Ihe, todavia, dedicar-se da melhor
maneira e usar de todos os recursos necessários e disponíveis. Isso também não quer
dizer que ele esteja imune à culpa. Enfim, essa é a idéia que tem prevalecido. O
contrário, seria conspirar contra a lógica dos fatos. Entretanto, face outra forma de entendimento, alguns defendem a teoria de que o
dano produzido em anestesia tenha configuração mais grave, por entenderem existir entre
esse especialista e o seu paciente uma obrigação de resultado. A prevalecer tal idéia,
diante de um mau resultado, qualquer que sejam suas causas, a vítima tem o direito de
fazer-se indenizar sempre. Nesse aspecto, com todo respeito, discordamos frontalmente, pois difíceis e
delicados são os momentos enfrentados por esses especialistas, notadamente nos serviços
de urgência e emergência, quando tudo é paradoxal e inconcebível, dadas as condições
excepcionais e precárias, e diante da essência dolorosamente dramática da eminência de
morte. Exigir-se deles uma obrigação de resultado é, no mínimo, desconhecer os
princípios mais elementares dessa especialidade. Hoje, mesmo em especialidades consideradas obrigadas a um resultado de maneira
absoluta, como na cirurgia puramente estética, já se olha com reservas esse conceito
tão radical de êxito sempre, pois o correto é decidir pelas circunstâncias de cada
caso. Iturraspe ensina que na obrigação de resultado o devedor assume o compromisso
de alcançar um objetivo ou conseguir um efeito almejado. E na obrigação de meios, o
devedor não assegura a consecução do resultado esperado, mas se obriga a empregar os
meios necessários e indicados para a proposta esperada, sendo o resultado secundário à
obrigação e não integrante como objeto do contrato ( in Responsabilidade Civil del
Médico, Buenos Aires Editora Astrea, 1979). Assegura ainda o mesmo autor que na obrigação de meios, o resultado que se
promete na assistência médica não é a cura do paciente, mas a forma orientada para
esse fim, desde que ele tenha empregado o melhor de sua capacidade e o que lhe é
disponível. Kfouri Neto citando os irmãos Mazeaud, transcreve: "O credor não tem,
então, que provar que o devedor tenha sido negligente, é ao devedor que incube
estabelecer que obrou com toda prudência desejável e esperada. Na pratica ter-se-ia o
seguinte: o paciente afirma que não foi curado. O médico não pode, então, permanecer
numa posição de negativa, pura e simples, dizendo: prove minha imprudência, pois do
fato de não haver atingido o resultado a que, sem dúvida, não se obrigou a alcançar,
mas para o atendimento do qual havia prometido empenhar-se, resulta uma presunção de
negligência contra ele. O médico tem, portanto, que provar necessariamente a prudência
e a diligência com que se houve. Por isso, conforma-se aos princípios da obrigação de
meios, obrigar os médicos a estabelecerem a certeza de que não atuaram com culpa"
(in Responsabilidade Civil do Médico, São Paulo: Editora Revista dos Tribunais,
1994). A obrigação do anestesiologista é de meio porque o objeto do seu contrato é a
própria assistência ao seu paciente, quando se compromete empregar todos os recursos ao
seu alcance, sem no entanto poder garantir sempre um sucesso. Só pode ser considerado
culpado se ele procedeu sem os devidos cuidados, agindo com insensatez, descaso,
impulsividade ou falta de observância às regras técnicas. Não poderá ser culpado se
chegar à conclusão de que todo empenho foi inútil face a inexorabilidade do caso,
quando o especialista agiu de acordo com a "lei da arte", ou seja, se os meios
empregados eram de uso atual é sem contra-indicações. Punir-se, em tais
circunstâncias, alegando obstinadamente uma "obrigação de resultado", não
seria apenas um absurdo. Seria uma injustiça. Dizer-se que a obrigação contratual do anestesiologista é de resultado porque
ele estaria obrigado a anestesiar o paciente, fazendo-o dormir e depois reanimá-lo às
condições normais é um equívoco. A não ser que se entenda como anestesia geral, por
exemplo, fazer dormir e depois acordar. Primeiro, é preciso entender que a função do anestesiologista não é apenas
fazer o paciente "dormir" e em seguida "acordá-lo". Depois, não
fazê-lo dormir e acordar, podem constituir ocorrências insuperáveis, embora raras, mas
independentes da vontade e do saber do especialista, ligadas às condições fisiológicas
e patológicas do paciente e decorrentes da própria limitação da sua ciência. Ainda
mais quando foram empregados todos os cuidados pré-anestésicos e solicitados todos os
exames necessários. O anestesiologista não tem como prever muitos dos resultados, pois
eles são também oriundos das condições multifárias do organismo humano. Acrescente-se
a tudo isso o fato de ser a Anestesiologia considerada por muitos como a primeira das
especialidades de alto risco, porque todos os seus instantes são críticos, são
complexos e são difíceis. A abrangência da competência do anestesiologista o leva não apenas aos
conhecimentos das técnicas usuais e aos cuidados pré, trans e pós-operatórios, mas ao
domínio da função respiratória, aos cuidados da atividade circulatória, da
prevenção do choque, da supressão do estímulo doloroso, da correção das alterações
dos líquidos eletrolíticos. E mais: exige-se dele o conhecimento e a execução
simultânea e, às vezes, imediata do acesso vascular superficial ou profundo,
permeabilidade das vias respiratórias, manutenção dos sistemas vitais, controle dos
equipamentos, domínio sobre os órgãos principais e acessórios da respiração,
controle das alterações gasosas, da capacidade residual funcional e controle da
redução do volume minuto. Em síntese, o que se afirma não é que o anestesiologista não cometa erros -
sejam eles de diagnostico, de terapêutica e de técnicas, ou que ele não seja nunca
negligente quando se afasta da sala ou imprudente quando desnecessariamente atua de forma
simultânea em duas anestesias. Mas, tão-só, que a anestesia tal qual vem se aplicando
hodiernamente no conjunto das ações de saúde e em que pese a relevância que se dê à
modalidade de obrigação, não pode constituir um contrato de resultado, mas de meios ou
de diligência, embora em casos de manifesta negligência ou imprudência venha se ampliar
sua responsabilidade quanto os métodos usados ou à terapêutica escolhida. Nos casos de maus resultados, onde se procure comprovar um erro médico, o que se
deve considerar, antes de mais nada, além do nexo causal e do tamanho do dano, é o grau
da previsibilidade do autor em produzir o resultado danoso e a culpa suficientemente
demonstrada, dentro das espécies negligência, imperícia e imprudência.
Nunca, de forma dogmática. prender-se a um princípio discutível onde se afirma
equivocadamente ser o ato anestésico uma obrigação de resultado, dentro da relação
contratual entre o médico e o seu paciente. A obrigação de resultado, onde se exige do devedor ativo de dar ou fazer alguma
coisa, parece-nos a cobrança contratual dos prestadores de serviços de coisas materiais,
ao não cumprirem a promessa quantitativa ou qualitativa de uma empreitada. Isso, é
claro, não poderia ocorrer na assistência médica. A não ser que irresponsavelmente
alguém prometesse tanto. Mesmo assim, qualquer que seja a forma de obrigação de meios ou de resultado,
diante do dano, o que se vai apurar é a responsabilidade, levando em conta principalmente
o grau da culpa, o nexo de causalidade e a dimensão do dano, ainda mais diante das
ações de indenizações por perdas e danos. No ato médico, a discutida questão entre a culpa contratual e a culpa
aquiliana, e, em conseqüência a existência de uma obrigação do meio ou uma
obrigação de resultado, parece-nos apenas um detalhe. Na pratica, o que vai prevalecer
mesmo é a relação entre a culpa e o dano, pois até mesmo a exigência do ônus
probandi hoje já tem remédio para a inversão da prova, qualquer que seja a
modalidade de contrato. 3. Bibliografia suplementar 1. Alcântara, HR Responsabilidade Civil e Penal do Anestesiologista, Rev da SBA, vol. XI, 141, 1975 2. ___ Responsabilidade Médica, Rio: José Konfino Editor. 1971 3. França, GV Comentários ao Código de Ética Médica, Rio: Editora Guanabara Koogan S/ A., 1994 4. ___Direito Médico. 6ª edição, São Paulo: Fundo Editorial Byk, São Paulo. 1995 5. ___ Medicina legal, 5ª edição. Rio: Editora Guanabara Koogan S/A.. 1998 6. ___ Responsabilidade Legal do Anestesiologista, Rev da SBA, Ano 26, n.º 3, 1978. 7. Lopes, TA A Responsabilidade Civil dos Médicos, in Responsabilidade Civil. Doutrina e Jurisprudência, 2ª edição. São Paulo: Editora Saraiva, l988. 8. R. Machado, ECSF Responsabilidade Civil dos Médicos. Tese de Mestrado. Faculdade de Direito da USP, São Paulo: 1985 9. Penasco, WL A Responsabilidade Civil, Penal e Ética dos Médicos, Rio: Forense. 1977. 10. Pereira, E e Vieira Z Visita pré-anestésica:: responsabilidade intransferível do anestesiologista. Rev da SBA, Ano 27, nº3, 1977 11. Rodrigues, S Direito Civil. vol. I, l8ª edição. São Paulo: Editora Saraiva. 1986 l2.Segre, M Aspectos médico-legais em anestesia, in Temas de Anestesiologista, Coordenação de Eugesse Cremonessi, São Paulo: Savier Editora de Livros Médicos, 1991. Índice
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http://lattes.cnpq.br/3546952790908357
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